Notícia - Clube que obriga babá a usar branco é alvo de investigação do MP17/06/2015 Clube que obriga babá a usar branco é alvo de investigação do MP
Advogada fez denúncia após babá de sua filha tentar entrar sem uniforme no Clube Pinheiros; para promotora, discriminação é evidente.
Sempre que eu estava trabalhando e a Débora*, a babá da minha filha, ia ao clube com ela, era um estresse. A gente nunca sabia se os seguranças iam deixá-la entrar ou não. Tudo porque o clube exige que babás vistam branco. Tentei conversar com a direção, mas não adiantou. Um dia eu cansei.
O depoimento acima é da advogada paulistana Roberta Loria, que acionou o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) com uma denúncia de discriminação por parte do Esporte Clube Pinheiros (zona oeste de São Paulo).
Não é só para resolver o nosso problema. É uma questão social. É revoltante essa discriminação ainda ocorrer. Sou sócia do Pinheiros há pouco mais de um ano e jamais imaginei que isso acontecesse, disse à BBC Brasil.
Após a denúncia, a promotora de Justiça Beatriz Helena Budin Fonseca resolveu abrir um inquérito civil contra o Clube Pinheiros (MP 43.0725.0000489/2015-2). Outros clubes de elite da capital paulistana também estão na mira do MP.
De acordo com o Ministério Público, o objetivo do inquérito é apurar a prática de discriminação social pelo clube ao exigir que as babás que acompanham as crianças sócias estejam vestidas de branco.
Uniforme e áreas exclusivas
Questionado pela BBC Brasil, o Clube Pinheiros confirmou que a utilização de uniforme na cor branca pelas babás está devidamente regulamentada através de normativa interna do clube e afirmou que assim como é comum em organizações a utilização de uniforme e crachá, o Pinheiros adota o mesmo tipo de sistema.
O clube confirmou ainda a existência de algumas partes do local que são proibidas às babás, como relatadas por sócios ouvidos pela reportagem. Existem áreas, como piscina e locais de eventos, que possuem regras específicas para o acesso, podendo ser reservadas exclusivamente aos associados. O clube ainda ressalta que repudia qualquer tipo de pré-conceito ou discriminação de quA promotora, no entanto, discorda da visão do clube.
Ao exigir o uso de determinada roupa pelas babás, o clube pretende marcar as pessoas que estão no local, circulando entre os sócios, mas que pertencem a outra classe social, afirmou Beatriz à BBC Brasil, ressaltando que outros acompanhantes dos sócios, como parentes, não são obrigados a usar branco.
A discriminação é evidente porque viola os princípios constitucionais da igualdade e da dignidade da pessoa humana. A regra é discriminatória.
Ameaças
Roberta conta que a regra para babás no clube não é algo explícito, que esteja em um quadro pendurado na parede ou algo do tipo.
Tanto que, nas primeiras vezes em que a babá e a menina foram ao clube, não houve problemas. A Débora poderia passar por mãe da minha filha. Então, quando as duas estavam sozinhas, acho que não percebiam que ela era babá, e ela não era barrada, conta.
Mas, quando ela foi identificada como babá, os problemas começaram. Os porteiros não queriam deixá-la entrar, falavam que ela tinha de usar uniforme, ameaçavam. Uma vez em que ela tentou argumentar, disseram que iam me mandar uma carta de advertência, conta.
E também achei péssimo quando, uma vez em que eu estava com a Débora e os funcionários falavam sobre ela, só olhavam para mim, como se ela não estivesse lá. Fora que ela já relatou que uma sócia interrompeu a conversa com ela assim que descobriu que ela era a babá da minha filha e não a mãe.
Por temer problemas futuros, Débora preferiu não falar com a BBC Brasil e pediu que sua identidade fosse preservada. Segundo Roberta, a babá acha que ela está comprando briga à toa.
O mais triste é que acho que, de tão acostumada a esse tipo de tratamento, não percebe a gravidade do problema, acha que é só uma questão de roupa.
Nada justifica
A juíza Beatriz Fonseca, no entanto, explicou como, em sua visão, o problema vai muito além disso.
Segundo ela, é válido que o clube exija que seus funcionários usem uniforme, por existir um motivo para isso. "Os sócios podem identificar os funcionários e solicitar a prestação de serviço de forma mais célere", diz.
Mas qual a necessidade de babás serem identificadas pelos demais sócios? Nada justifica esta obrigatoriedade, a não ser a possibilidade de imediata identificação de que a pessoa não é sócia. Mas qual a necessidade desta identificação? Afinal, os convidados dos sócios, amigos e familiares não são obrigados a usar uma identificação que os discrimine, que indique não serem associados.
Exemplo carioca
O ofício contra o Clube Pinheiros foi enviado pelo Ministério Público no dia 10 deste mês. O clube, que diz que até esta segunda-feira não havia recebido o documento, tem 20 dias para se posicionar.
Após o posicionamento do Pinheiros, o Ministério Público vai decidir se entrará com uma ação pública. Outra possibilidade seria a realização do chamado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), um instrumento jurídico no qual os clubes assumiriam o compromisso de ajustar suas regras conforme solicitado, sob risco de sofrerem sanções (normalmente multas).
Roberta, que está grávida do segundo filho, conta que uma de suas expectativas com o caso seja um desfecho semelhante ao que aconteceu no Rio de Janeiro.
No ano passado, o governador Sérgio Cabral sancionou uma lei proibindo clubes de exigir uniforme para a entrada de babás e de acompanhantes de idosos, com pena de até R$ 2,5 mil para quem não cumprir a regra.
Semelhante ao caso de São Paulo, a lei foi criada a partir de uma representação no Ministério Público feita pela ONG Educafro. A promotoria então instaurou um inquérito civil para apurar possíveis casos de discriminação nos clubes de elite Paissandu, Naval Piraquê, Jockey Clube e Caiçaras, na zona sul.
A denúncia da ONG veio na esteira de um caso ocorrido no clube Caiçaras, na qual a babá Elaine Pacheco foi barrada por não estar de branco, mesmo com seu nome estando na lista de convidados de um evento que ocorria no local.
* A pedido da babá, seu nome real foi omitido qualquer caráter.
Fonte: R7
Sindoméstica Sorocaba - Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos de Jundiaí e Região